lunes, 16 de noviembre de 2020

 Nada es terso

hablo de la imposibilidad

del desconcierto

de la falta de armonía de las cosas

si supieras que te vas a morir.


martes, 10 de noviembre de 2020

antes do encontro

procurar uma escada de madeira

dando para o abismo

é uma ação que só pode acontecer nesta língua

estranha e numa cidade cortada por um rio

que fique no meio dos dois

(quando um precisa ir embora

para sempre)

 

mas um dia ela chega

com a pergunta:

— o que vem à sua cabeça

quando digo a palavra

amor?

 

um dia desce no meio do dia

e vê. e um dia vê a peça lilás sobre a quina da mesa

quando volta. ele diz saltar. saltar para fora.

e atravessa na esquina

procurando a escada. depois diz que quer saltar

para fora desta canção.

 

mas um dia chega com

a pergunta:

— o que vem à sua cabeça quando

digo a palavra amor?

e ela responde

que amor em japonês

se diz /ai/.

 

e, de repente, um branco.

as linhas se tornam cada vez mais

quebradiças. um banco parado no meio da cena,

um quadrado iluminado e a frase mais longa

que ele me disse nos últimos

seis meses.

 

o que significa um cachecol vermelho

pinicando sozinho?

uma abelha, pensa, mas o cachecol pinicando,

voando como uma abelha, talvez um inseto

estridente, incidente para ouvir quando ele

chegar e vir.

 

agora sobrou apenas a estática

tremendo e você a leva de volta até o barco:

— a estática?, pergunta, você lembra

daquela vez? e ela fica parada na chuva

com o colete salva-vidas esperando

alguma coisa acontecer.

 

[aqui o telefone

vibra na bolsa e um parêntese

para dizer que não sabe onde está mas é longe

não sabe onde está mas é frio

não sabe onde está mas é quase.

ao ouvir a voz,

parece de verdade,

e então ele levanta e me diz algo

sobre o fim

ou sobre o sim

e toca na tela uma imagem

do filme]



Marilia Garcia (Río de Janeiro, 1979)